domingo, 24 de fevereiro de 2008

Greenish bubbles as iidich mumble-jumbles

Úteros artificiais. Luzes verde-azuladas, frias... Grades... Tubulações... Máquinas ninando... coisas... Cantigas rangidas entre fiações coloridas. Alumínio. Ferro. Vedações. Você, como um Deus. Tuas pupilas frias sobre aquelas criações vindas de ti. O contato de nós dois. Um presságio da sensação de peso insustentável em teu corpo. Um flash no teu rosto de menino da verdade por trás de nós dois.

Eles estavam presos. Mas, você também não era livre. Rato de laboratório. Simples código genético. Amorfo. Você foi mais sepultado que teus descendentes. Eu respirei o ar de várias cidades. Vi o sol se pôr e subir de novo. Nuvens. Folhas. Eu pintei o deserto de vermelho. Frases foram ditas só prá mim. Rocei a morte todo novo dia. Derramei-me em dezenas de mulheres. Cetim, seda. Loira, morena. Sei montar minha pistola de olhos vendados. Treze pontos fatais. Distingo o medo no teu suor.

Sei... nunca fui tão livre também. Mas eu te achei. Arrombei a porta da minha prisão. E a da tua. Tiros. Minha carne. Meu olho. Toda a realidade despencando em mim. Neóns. Sinais. Teus gráficos continuam um mistério. Tu só recolhe dados meus. Estéril. Buraco-negro. Sabes que não te pouparia. Sabes o que eu quero. Mantenha essa distância saudável. É esperto em não confiar em mim.

E então o jogo muda. Teu sorriso. Tua voz. Espio tuas brincadeiras. Meço tua aproximação do garoto. Onde está o padrão por trás dos teus atos? Teatro. Entre xícaras te estudo. Noz moscada. Maçãs. Aposto isso. Corre na minha espinha que está tramando algo... Que peça somos no teu tabuleiro, garoto-ancião?

Porque ainda me força a carregá-lo? Aquele pedido extremo, refletido nas poças sujas. Tuas lágrimas, quando antes? Nada disso combina. Cadê aquele serzinho raquítico? Onde escondeu tuas feições desbotadas? Céu cinzento rolando sobre nós. Tu me pressionas com um abraço estreito demais. Ruas num vôo uivante. Tua presença às minhas costas. Um magneto que me derruba para dentro de você. E sempre esbarro em teus portões fechados.

Tua pele clara é menos pálida que a minha. Tuas feições de menino, mais humanas. Teu olhar inspira compaixão. O meu, jamais. Derivo de ti: quando mergulho em teus olhos, no som de tuas tripas, no ritmo de tua respiração, reconheço minhas raízes. Não somos iguais, sequer parecemos...

Ah!... Aposto que o que é não passa de engodo. Você se esconde. Tudo, uma densa camuflagem. Sim, pressinto o blefe em cada silêncio teu. Hora ou outra, as cartas acabam. Vou olhá-lo direto entre os olhos, como na primeira vez. E dessa derradeira vez... te farei falar.


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Now playing: Linkin Park - Figure.09
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sábado, 23 de fevereiro de 2008

Vanilla desire into my cinammon butterfly

Hmmm... tua penugem escura entre meus dedos... tão rala e suave no meu gesto afoito... O cheiro de fêmea adocicando meu alojamento, entremeado com o meu. Teus olhos oblíquos arregalados prá mim. A boca pequena entreaberta num grande susto. Tu não estavas preparada para me encontrar, não é?

Depois daquela primeira vez, anos se arrastaram sobre nós dois. Quando eu voltava, recebia tuas boas-vindas mudas. Um prato de comida na pequena mesa. Uma massagem lenta enquanto você me desnudava sem pressa. O banho de esponja pelas tuas mãos macias. Tua cara altiva ao me servir. Teus olhos marejados quando te fazia minha de novo, como uma boneca. A pele sedosa do teu corpo miúdo enrolado no meu quando eu me acordava de madrugada suado e insone...

Geralmente não era assim, eu sei, lembro bem. Eu te assediava por pura vileza. Te humilhava, sacaneava tuas boas intenções. Gritava contigo as vezes, só para ver tuas lágrimas, tua decepção. E quando fazia sobre você, fazia doer. Flores vermelhas por tua pele bronzeada. Tuas coxas, roxas. Te rasgava prá dentro com fúria. Quando os gritos deles não saciavam minha sede, era tu que pagaria de vítima. Até que tirasse de tua língua quieta os xingamentos, o ódio, ou as súplicas que faltassem prá encher meu ego cruel.

Mas, as vezes, raras vezes, tínhamos algo diferente disso tudo... Você vinha a mim, manhosa. Me fazia mimar teus cabelos de seda negra. Coisas murmuradas na tua voz cantada, como se tu fôsses menina inocente. Deixava que tu arrancasse minha segunda pele prá que teu rosto faminto sumisse em minha virilha. Tu exigias de mim a primeira salva, mais urgente. Então tu te davas aos meus apetites, pedindo mais. Os peitos pequenos em fruto. O ventre liso e ondulante. Te possuía devagar e tu me devoravas fundo, me puxavas, me socava entre tuas carnes molhadas. Ah!...

Meu objeto desprezível. Imunda de mim. Propriedade desgastada.
Te usei tanto... tanto que me dava tédio encarar-te me esperando ao destravar a porta... Eu pedia por outras...

Jamais pensei que fôsse implorar por ti no sono agitado... Acreditaria se hoje te encontrasse e sussurrasse: 'me faz falta, você...' ? Tu. Não sei teu nome. E tu... só conheces essa sigla tatuada em mim. Crescemos todos esses anos, juntos... continuamos perfeitos desconhecidos...

Drowning delusion on marine tourmalines

Era uma madrugada insossa e molhada. A água repicava no gorro da capa de chuva do meu technoprene. O tamborilar contínuo ecoava o das poças, o das placas de metal enferrujado, e me levava a um estado de frenesi meditativo. Via formas correndo entre os monturos. A água escorria em bicas dos meus braços, das minhas costas. Um pensamento vazou: podia estar seco sentado lá na Igreja ou deitado num putedo...

Mas foi nesse instante que você se pronunciou, e eu te achei. Foi por acaso, poderia não ter passado por aquela pilha de lixo. Curiosidade, e não piedade, ou qualquer outra coisa, foi o que moveu meus braços para te desenterrar dali. Você não entende isso, não é?

Para seus olhos de criança, eu sou seu Salvador. Mas basta um tanto de inteligência, basta uma pitada de sabedoria qualquer, para ter certeza de que não sou como aquele na Cruz. Não. E eu abomino essa tua gratidão, garoto. Detesto quando me leva regalias. Me incomoda quando gasta tuas frases infantis comigo. Você insiste. Tuas mãos pequenas procuram brechas para me atingir - não quero que me toque. Você me causa ganas! Eu não sou teu herói!!!

... Pedi ao Santo que o mantivesse longe de mim, que cuidasse da tua segurança. Ele não me responde, simplesmente esboça um sorriso, como se tivesse me vencido. No que?!... Talvez ele confuda meu silêncio, meu descanso, com mansidão - e isso seria um grave erro.

Te dou as costas. Berro contigo. Mostro os dentes. Se afaste de minhas garras, fedelho! Para que saiu daquele lixo se agora testa tua sorte comigo? Não quer ficar velho, idiota?!

Do meu canto eu escuto tuas lágrimas no assoalho da Igreja. O ruído delas é doce e singelo, ninguém além de mim mesmo para escutá-las. Tuas palavras solitárias, tu as dirige para aquela coisa de pelúcia imunda e esfarrapada que te dei. Acho que ela também não pode te dar nada, pivete. Sequer te ouvir. Mas ao final, ressonas abraçado nela... Inexplicável... Qual consolo retiras do vazio?

Fecho o olho. No escuro de minha mente, você sempre me ataca de novo. Sinto meus músculos contraídos tentando escapar ao teu corpo frágil, implodidos para dentro, soterrando meus sentidos, sentimentos.

Arfo cada vez mais pesado, tu me pressionas com a tua inocência, com tua carência tão extrema. Sei que vais morrer. Sei. Sei disso a cada batida do meu coração e do teu. Sou o único que pode... o único para te estender a mão ou pode ser tarde demais. Sei. Sei disso. O sangue escorre de mim, como se a chuva o fizesse brotar de minha pele. Sangue de todos aqueles que me afirmaram quem sou. E você ainda, ainda me olha pedindo, pedindo tão aberto, sem defesa alguma, sem chance alguma.

Eu vacilo. Como vacilei naquela noite. Me deixo confundir. Eu atravesso a soleira da porta. Eu me atiro de costas no penhasco. Emerjo do mar revolto, afogando, sendo levado, mas você está em meus braços. Tento deixá-lo acima das ondas, estou descendo. Você se recolhe contra mim e eu puxo forças e nado, nado até que meu corpo esfrie. Estou morrendo, mas você beija meu rosto cínico e gelado. A água invade meu peito, mas estou calmo, você ainda acarinha meus cabelos. Me olha até o cerne enquanto apago e te escuto dizer "sou eu que te salvo".


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Yuki Kajiura - Echoes
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Dark dread thoughts down my decised cold knees

Li palavras mentirosas no Cântico... Palavras que afirmam que há um Todo a ser louvado, um Todo do qual participo. O Santo me explicou que a única coisa necessária para ser uma parte desse Todo, é existir... Porque todos fomos uma vez Um... Eu só consigo ver partes. Eu só consigo sentir um limite asfixiante entre os outros e eu, e não parece diferente entre cada um.

Há anos que observo esta sociedade, vivendo como um intruso. Posso classificar a maioria dessa gente. Os vermes, só rastejam aproveitando o que sobra da podridão. Os chacais e hienas apenas atacam os fracos para roubar-lhes o pouco que têm, acham-se fortes e soberanos, mas nada mais são que covardes estúpidos. Há o rebanho, obediente e trabalhador, sabem que há algo errado, mas não conseguem ver que eles é que alimentam tudo isso. É, eu vejo, acima deles todos, os mestres disso, os únicos que ganham realmente, os únicos que mandam realmente, leopardos e lobos, esperando com suas goelas enormes e suas panças insaciáveis para devorarem. O que há de similar entre eles? Como podem uns e outros, todos, serem partes iguais desse Todo?!

Mas o Padre insiste que o Todo é feito de cada um de nós, e que para o Todo conduzir a um Mundo melhor, é necessário que nós façamos o movimento. Até que a massa saia da inércia. Ike quer que acredite que faço parte disso tudo, mesmo eu não sendo parte dos planos da Seleção Natural, mesmo eu nem sequer sendo fruto da união de suas criaturas, mesmo eu não servindo para perpetuar nenhuma espécie para a Glória do Todo...

Então... sou uma célula de Deus. Uma fibra de seus músculos. Um neurônio de sua mente infinita. Um bacinete de sua retina, testemunhando por Ele.

Sou?... Serei mesmo isso, ou só gostaria, agora que começo a entender tudo pelo que agora me ajoelho e peço perdão? Eu só levei imagens de todos os crimes que cometi, fixando-as em seus Olhos, o sangue, as lágrimas, bocas esgameladas pedindo pelo Teu Socorro, mas imune à clemência.
O neurônio que acorda para maquinar Contigo a destruição. Sou a fibra que tantas vezes ergueu o Braço para esmagar quem estivesse em desamparo, quem lutasse contra todo esse lixo. Eu não sou uma célula - sou o miasma de Deus!

Torço os dedos, abaixado diante do Crucificado, ele me olha como se fôsse uma de minhas vítimas, mas seu olhar é mais forte que o meu... Prendo o ar, meus pulmões ardem como se respirasse ácido. Baixo a cabeça. Ele me perdoa?... Acho que não. Eu não me perdoaria. Ainda sonho com o prazer da batalha, ainda salivo ao destravar um coldre, ainda os vejo como alvos. Minhas narinas buscam o cheiro de sangue. Meu corpo todo pede para matar.

Sou o câncer, regurgitado da sujeira, inesperado, hostil, desgraçado - eu sou o que consome o Tecido do Todo, esse sou eu!...

Minha existência é a subtração desse Todo...


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Now playing: Yuki Kajiura - Fake Wings - Make Decision
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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Fractal flesh on factoid flashes

Estava dirigindo o caminhão, quando de repente, minha memória foi invadida por aqueles eventos esquecidos. Por meses eu me torturei, procurando pistas sobre meu desvio... Um instante qualquer em que tivesse pressentido que iria sair da estrada... Eu lembrei... finalmente.

Cores. Fragmentos estanques de espaço-tempo. Como uma estilhaço de ferro quente, sua figura perfumada. Era meu primeiro dia em campo junto com civis. Via por cima dos bancos, o recorte dos ombros do CANNIBAL número 3, um dos sêniores. 'Tava tão nervoso e cheio de adrenalina que poderia gritar e correr em círculos, subir muros e me atirar de um penhasco. A caravana perdia Midgard quilômetros atrás.

Tédio, nada acontecia. Do meu lado uma sentença grave se passasse o sinal. Tinha que suportar. Imaginei que era um teste. Que, a qualquer momento, minha concentração seria vital. Eliminar alvos. O campo verde em minhas pupilas. Uns acionistas gordos, uns ratos de laboratório e tocando o circo, o teu pai, lá na frente. Pela janela, um Mundo que eu desconhecia. Risadas cínicas, comentários maliciosos de impotentes. A poucos centímetros de mim, você, dividindo o banco comigo.

O couro claro exalava cheiro de cera. O teu fruto proibido me enchia a boca de água.
Um céu claro demais, de um creme berrante que faísca dourado. Cerro meu olho só de recordar. Meu rosto, tão mais novo e zerado, espelhado em teus olhos insistentes. Eu via árvores... Nuvens... Céu... O que conversamos? Suas palavras velhas, de dez anos, sopram de novo, uma coisa ou outra. "... tudo que nasce tem uma ligação especial..."

Um feixe de luz dançava na tua blusa, iluminava ora tua boca, ora uma mecha de teus cabelos negros. "... o que fez até agora?" Tu eras não mais que uma garota recém pondo peitos. " ... mas é feliz?" Feliz... Número três respirava devagar. Teu pai metralhava explicações. Fecho o olho e ainda posso sentir tua mão sobre a minha, escondida deles. "nunca tinha sentido falta do céu? eu sempre..." Um projeto. Melhoramentos. Reservas ricas em carga genética...

"Você é um animal livre como... " Vozes de feras decantando fundo. O cheiro do vento. "... correr pelo Mundo?" Teus argumentos iam num crescendo de desespero e intimidade. "Não suporto o que meu pai está fazendo com você! conosco!... você é muito mais que um cão de guerra! " Tua coxa encostou na minha. Fiquei duro e tentei me concentrar em não dar na vista. Vi uma mancha azul vibrando, vibrando entre nuvens. Eu achava ainda que era o soldado perfeito.

Espio pela janela do caminhão e relembro de fazer o mesmo gesto quando tu me apontavas insetos, pássaros distantes, flores sobrecarregadas de cor. "... o que você realmente quer?" Teu coração impunha um ritmo de pedidos urgentes: me liberte, me entenda... me foda... Não a atendi, fiz tudo parecer que a ignorava.

Enfrentamos ameaças por duas vezes.
Entrei no blindado como teu campeão, primeiro aplaudido, depois espreitado com pena. "... estava me protegendo mesmo?" "... não" "... só quer ver sangue..." "... você só tem esse maldito treinamento, não é?!" Espreitava lágrimas em teus cílios pesados. Mas o que te fazia sofrer, eu não conseguia alcançar... "por que não me responde???" Saí da missão sem máculas, com recomendações. Pus você em seu lugar. Uma simples boceta civil. Fiz carreira. Tinha virado a página...

... ou assim pensei...

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Fever breaths deeply on chocolate seas

Me torturo. Recordo, outra vez. Era teu corpo grudado no meu. Contra meu peito desprotegido, teus calafrios sob a coberta macia demais. Você, um cadáver respirando. Eu era o combustível que devia manter a tênua chama da tua vida acesa. Por que me importo?... Porque... você... você não pode morrer.

Meus braços se negavam a relaxar, a desabar contra ti e arrastá-lo ainda mais perto... Como eu me perdoaria por juntar-te contra mim sabendo que aquela fome ia consumir-me pelas entranhas, selvagem e veludosa, até arrancar-me tudo? Não... eu não podia abraçá-lo.

E se me obrigasse a falar?... Eu teria voz? Me socorreriam palavras com algum sentido? Correndo contra mim e para ti, eu estive duplamente fora do meu lugar. Estava quase à mercê, mas acuado demais para baixar as minhas defesas - eu o faria em pedaços. Não... nós jamais poderíamos ter ido mais longe.

Coisas espalhadas erraticamente. Todas... em todas... teu cheiro... e de novo... Em todas... todas... aquele testemunho de quem você é... Aquele lugar é você... Você está em tudo ali... Faixas de gaze... Roupas toscas... Sapatos sujos... Cama desarrumada... Pratos mal-lavados... Sei o que comeu... Como dormiu... Tuas feridas... Você me sufoca até que o deixo entrar, cada inspiração, um pedaço seu vêm a minha consciência... Eu te monto feito um quebra-cabeças interminável... Cada peça... um sentimento de advertência... o horror de talvez não conseguir abandoná-lo...

E se você...? Não... isso nunca.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Solid holes fills with neurotic pine circles

Como uma dessas peças coloridas de madeira que vejo as crianças brincarem: - círculo amarelo no buraco do círculo, quadrado vermelho naquele do quadrado, triângulo... - eu não me encaixo.

Entre elas o que sou me exclui.

Ao lado do Santo... Ah, então tudo é irreal, sinto-me nadando em drogas, mergulhado num delírio. Como encaixar em algo que parece ilusão? Como carregar um clip numa arma de holograma.

Há um instante - um único instante - em que me percebo funcional. Quando tudo segue certo e rápido. Onde sou com o tempo: rastro perfurante de momentos plenos. Sucessões. Pulsação. Alvos a serem eliminados! Eles me gritam quem eu sou. Caem. E quando silenciam, murmuram quem eu sou...

O povo daqui me bolina com elogios. Me rotulam como "seu protetor". Não sei o que isso significa. Em missões de guarda-costas, ainda assim, sou aquele que matará antes. Para mim, essa é a chave: calar a vida do outro, antes. Eles me bajulam. Sei que não me pagarão. Outros vão e tudo fica bem. Sou o "herói". Eles, os cegos.

Eles me agradecem, por suas vidas... Eu só cumpro minha missão. Porque eu... sou eu. Nada mais. Nenhum outro. Preciso mostrar a mim mesmo, toda a noite, quem sou: eu eu eu! Ainda... eu.

E quando descarrego o bolso e minha palma se abre pesada de gils sob os olhos frios do Reverendo, sinto algo estranho e perigoso, não fôsse isso, patético. A respiração dele me embala. Sua resistência e depois seu sorriso tudo é honesto. E ele me olha diferente, parece que me faz encaixar...

Com mal-estar reconheço naquele silêncio em que dialogamos: esta é minha função aqui. Estou no lugar para o qual fui esperado. Ele me acolhe entre eles. E me abençoa...

Sou seu inimigo, por estas mãos, por minhas idéias, pelos tantos que enterrei, pela Corporação, por cada proteína dos meus genes, mas ele acredita que os salvo.

Como uma dessas peças coloridas de madeira... círculo amarelo no quadrado... hiberno meus dias agarrado a arestas imperfeitas... quase caindo... sem entrar... eles juram que é onde devo estar...

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Now playing: Red Hot Chilli Peppers - Knock Me Down
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Slashing ice eyes over mute azymuth blues

Teus olhos fixam-se em mim. No batimento seguinte de meu peito, sinto que já te retiras.

Às tuas perguntas perfurantes, que te pareço?

Se franze a boca pela minha resposta estéril, sabes tu que te dou o vazio que tenho? Se teu azul esfria esperando mais de mim, sabes tu que nada mais há?

Meu olho combate os teus, mas perde. Escapa num pedido: "não procures aquilo que me falta..."

Tua presença me enverga sobre a vergonha de uma virtude impossível.

Cada sentença seguinte, escapa de teus dentes como o zunir de minha adaga. Não há sangue escorrendo de mim, embora me prostre e rasteje. O que rasga é mais profundo que a carne...

Lá, onde deveria haver uma alma...

Mas eu não te renego. Não te abandono. Sequer penso em eliminar-te, meu ofensor.

Apenas te aceito em silêncio.

Meu Castigo...

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Now playing: The Last Samurai - 02 - Spectres In The Fog
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sábado, 2 de fevereiro de 2008

Cynesthesic hairflow on golden god sodas

Poeira... Fervilha um spray de partículas douradas que balança em câmera lenta frente a luz do sol que desce... Uma única pupila, vórtex do buraco negro, capta com esforço o limite de cada uma, flutuando, quase imóvel. Entre tu e eu.

Um mar de reflexos na ondulação de teus cabelos aloirados. Absorto, escuto a quietude de teus pensamentos e passeio no desenho que tecem. Te vejo. Meu olho é coberto pela tua figura deslizante e nesse fugaz momento, tu és o Mundo convertido em Você e o Seu cenário... tudo, tudo a tua volta parece respirar para ti, moldar-se a teu andar...

Quem és?... Se eu fôsse outro, e nos olhasse agora de fora, com esse olhar de quem se apaga para ver... veria a mim também como um acessório teu? Seríamos o Mundo... Eu estaria ao teu lado só para compor a tela perfeita?... Se assim fôsse, eu e tu, indissolúveis, tu arrastaria-me sob teu destino e eu simplesmente orbitaria tua jornada...

Olho de olhos semi-cerrados e toco paraísos em teus fios soprados de inércia. Dá-me um deles que seja... um deles, solitário e longo na palma de minha mão, dourado sob o fio da minha retina, dormitando entre minhas digitais, impregnado no profundo dos meus pulmões até a minha inexistente alma... tsc... ela se abriria em sacrifício a esse Deus, eu sei, se fôsse cativada por um único fio do teu cabelo... um único fio, conduzindo-me para dentro de todo o segredo amplo que és... ou somos...

Se me estendesses um só fio do teu cabelo... toda a minha carne prostrada a seus pés...

Eu vislumbro o Todo em c-a-d-a curvatura dos teus cabelos...

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Now playing: Nujabes - Beyond
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Ruby rain falling on a velvet mourning

Há um eco de prazer em mim. Nas cavernas escuras desse peito oco, murmura um arrepio. Sabor do sangue em minha língua. Socos, pulsos, em meus tímpanos tampados.

Abatido pela foice de todos os atalhos que tomei, descanso agora na sombra do nascente. Trêmulo, escapa-me sorrisos febris de dor. Círculos concêntricos desse excêntrico vermelho. Carmesim que contemplo. Body art. Minha desarte. Desastre. Líquido fervilhante que foge e tinta a pedra fria do calor pálido que sou.

Conto em números cada vez mais lentos. Perco o tempo em adivinhações de figuras falhas fingidas como minha alma - imaginária... Nada há de mais belo e fugaz que aquela gota que me escorre e me marca e me escapa e me transcende para além de mim, além dos limites - rubi!...

Ah, rubi!, que se lança ao abraço do Todo... e, obliterado, precipita-se no Nada...

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Now playing: STAIND - Black Rain
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Snow-white skin zero-celsius paramecius

Confesso... (termo estranho, coisa daquele Padreco!) Confesso que me dá terror sentir tuas mãos pequenas e brancas tocarem minha carne. Quando durmo, acordo alarmado e percebo que é só você se recostando em mim...

Quem pensa que é, para tal licença?! Quem pensa que EU sou?!!

Já aprendi que teu toque não significa meu prazer... Humilhante... - Tive ganas de esguelar-te, prensando esse teu pescoço magro, fraco!, entre minhas garras até que não sobrasse uma molécula sequer de oxigênio nesse teu corpo débil!!!

Não consegui. Por que? Foi o primeiro que não eliminei. Me pergunto todos os dias: - por que??? Seria porque tu és tão submisso? Porque não te excedes contra mim, nem revida?... Não... Talvez porque sejamos próximos no núcleo de cada célula. Talvez porque você seja VOCÊ - o Marco Zero. E talvez eu deseje aprender o que você sabe.

Pode ser um engano. Posso acabar descobrindo que você é uma fraude. Nada tem a me ensinar que valha o ar que você respira... Se o que eu pressuponho for um delírio, então...

Os dias correm e você não solta sequer uma frase inteira. Parece me sondar e conhecer meu desejo. As crianças brincam, comem, brigam, dormem ao nosso redor. Você, porém, continua preso a mim, mesmo que eu não o tenha algemado... E seus olhos sobre meu rosto não são os de um condenado, e sim de quem me sentencia...

Nossos diálogos são só nossos. Gestos, olhares, cheiros da pele. Absurdo quantas vezes teus argumentos já me interromperam. Quantas vezes abaixei a voz, recuei numa decisão, engoli a ira, ou acompanhei você. Quantas vezes aceitei sentar-me nesse mármore frio para que você deitasse em meu colo?

... e olhando seu sono sereno, quantas vezes me questionei quem eu seria se não tivesse sido quem fui?...

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Now playing: Fort Minor - Petrified
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